A ibogaína é talvez a droga alucinógena mais impressionante de que se tem notícia. Não bastassem seus efeitos avassaladores sobre a consciência – induz o coma, provoca visões e muda a vida de quem a consome, segundo eles mesmos –, essa raiz
africana pode curar a dependência de outras drogas. Ela é uma das
substâncias mais perigosas que se conhece – muita gente já morreu por
sua causa. A antropóloga paulista Beatriz Labate, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), viajou a Camarões para conhecer de perto a ibogaína. Eis o seu relato – o primeiro do tipo escrito por um brasileiro:
“A iboga (raiz
cujo princípio ativo é a ibogaína) é utilizada na África Central no
tratamento de depressão, picada de cobra, impotência masculina,
esterilidade feminina, Aids
e também como estimulante e afrodisíaco. Os curandeiros locais, adeptos
de uma religião chamada bouiti, acreditam que ela é eficaz também
contra doenças místicas, como a possessão.
“Tonye Mahop, pesquisador do Jardim Botânico de Limbe, conta que
‘existem vários registros de cura da dependência de cigarro, maconha e
álcool com a iboga. O problema é que os informantes não contam bem como
preparam e usam a planta. Tem uma parte do conhecimento que fica sempre
em segredo.’
“O ritual
de iniciação, no qual a substância é ingerida, dura três dias. Na
abertura, o candidato confessa todos os seus pecados e toma um banho ritual.
Depois ele come em jejum até meio quilo da planta. Um grupo o acompanha
cantando e dançando noite adentro. A iniciação tem como objetivo
induzir um coma.
De acordo com os praticantes, em algum momento o espírito sai do corpo e
viaja para o ‘lado de lá’. Ou seja, visita o mundo dos mortos. Pode
receber revelações, curas ou se comunicar com seus ancestrais. Terminada
a cerimônia, a pessoa ‘renasce’ com uma nova identidade – bandzi, ou
‘aquele que comeu’. A anciã Bilbang Nga Owono Christine, lembra bem a
sua iniciação, quando teria se curado de uma ‘doença nos olhos’: ‘Uma
estrela me guiou até um hospital no lado de lá. Vi meu espírito saindo
do meu corpo e os médicos me operando. Voltei curada’, diz.
“Podem ocorrer mortes nos rituais se a dose for grande demais ou se o
sujeito estiver debilitado. Da mesma forma, três pessoas já morreram no
tratamento não-controlado de toxicodependentes com ibogaína na Holanda,
na França e na Suíça. Alguns especialistas afirmam que a ibogaína age
sobre áreas do cérebro que regem a sensação do corpo físico. O resultado
é que a pessoa constrói uma imagem do ‘eu’ fora do corpo. Os relatos de
alguns iniciados se assemelham muito aos de pessoas que estiveram perto
da morte. Em ambos os casos, fala-se na presença de uma luz infinita
que seria a própria divindade, no encontro com mortos, na vida inteira
passando diante dos olhos.
“Participei de uma iniciação, mas comi apenas uma colherinha de
iboga. O efeito foi fortíssimo, durou 24 horas. Não posso dizer que
entendi muita coisa, além de ter achado o ritual
bastante cansativo. A sensação foi de que os nativos têm razão: a iboga
é qualquer coisa que não tem a ver com este mundo, diz respeito ao
mundo dos mortos. Ficou apenas uma enorme curiosidade – e medo – de me
submeter à iniciação completa.”
fonte: Superinteressante
Nenhum comentário:
Postar um comentário